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10 Perguntas para George Christian

George Christian Vilela, é baiano, licenciado em Letras (inglês) pela Universidade Federal da Bahia e estudante de música na mesma instituição. Para mim o som que ele faz é música clássica contemporânea, com algum toque de rock e jazz. Para ele, é bem mais difícil definir. O músico que no atual momento trabalha em uma sinfonia conta um pouco de sua história musical. Confira:

Taís Veloso : George, suas músicas são muito lindas e eu sinto que elas acalmam. Você pensa nisso quando vai compor ? De maneira geral como acontece o seu processo criativo ?

George Christian: Muito obrigado mesmo pelo reconhecimento! Nem sempre penso nisso, mas é realmente uma vontade minha expressar tanto a calma, quanto a turbulência. Tenho um trabalho variado, álbuns que são distintos conceitualmente. Mas é sempre importante para mim estabelecer algum tipo de comunicação e empatia com o ouvinte. Meu processo criativo se dá de uma maneira muito espontânea. Há trabalhos em que basta a criação de uma afinação ou de uma frase musical para desencadear todo um processo narrativo quando eu componho. Há composições que são mais estruturadas do que outras. Mas uma larga parte de meu trabalho instrumental advém da ideia de uma composição em tempo real, no momento da gravação. Não é pura e simplesmente uma livre improvisação. É algo que é gestado dentro de algumas estratégias.

Taís Veloso: Nossa, que legal. E como você faz para memorizar? Você compõe com um gravador ao lado ?

George Christian: Componho gravando e registrando diretamente no computador. Já houve época em que recorria ao celular, mas hoje prefiro uma melhor qualidade de áudio. Há composições escritas em partituras também, que normalmente não estão voltadas para a improvisação. Aí eu recorro ao Sibelius (programa de notação musical). Ocorrem também as parcerias musicais. Às vezes, tenho uma gravação que me é enviada para que eu grave um instrumento meu, em outras sou eu é que envio uma gravação minha para que se adicione(m) instrumento(s) que não meus.

Taís Veloso: Como em flying rivers por exemplo ?

George Christian: Exatamente! Foi um trabalho em que houve uma variada gama de sonoridades que me foram fornecidas pelo compositor e multiinstrumentista Jeff Gburek e aos quais adicionei o meu toque guitarrístico, apesar de algumas faixas advirem de bases minhas, como "Moving, Waking, Surviving".

Taís Veloso: Falando nisso, me conta um pouco dessa parada instrumental na sua vida. Quando foi que o instrumento tomou seu coração? Qual foi seu primeiro instrumento ? Tem músicos mais antigos que você na sua família? É algo herdado ... genético?

George Christian: Uou, é uma história comprida, mas tentarei resumir. Eu me lembro que minha mãe chegou a ter um violão Di Giorgio quando eu era criança, mas ela nunca teve oportunidade de tocar ou aprender.


Esse violão de nylon me despertou o interesse, mas nunca pensei na possibilidade de me tornar musicista até os 14 anos, quando ingressei num curso particular de violão, no qual aprendi tanto a tocar música popular como, também, o violão erudito. Até que tive uma primeira e, infelizmente, única aula de piano na infância, como também ganhei um pequeno teclado Casio aos 12 anos. (Curiosamente, meu irmão um ano mais novo, Alex, foi quem primeiro resolveu aprender a tocar violão.) Houve um disco que me despertou fascínio na adolescência, nos meus 14 anos, que era um LP triplo da banda Yes, o "Yessongs", que me despertou um tremendo interesse musical. Não exatamente comecei na guitarra; mas meu primeiro heroi guitarrístico foi o Steve Howe. A faixa instrumental "Mood for a Day" me fez querer aprender violão clássico.

Quanto a antecedentes familiares, tive sim, por parte da família de minha mãe, um bisavô que era timpanista e chegou a maestro na filarmônica da Lira dos Artistas em Santo Amaro da Purificação, de nome Ladislau Lopes.


Afora ele, parentes meus ainda vivos: meu tio-avô Dilo Vilela (que chegou a ser meu instrutor por um tempo) e meu primo, filho dele, Daniel Lopes. Se é algo que foi "herdado", pode-se dizer que sim, mas vim do proletariado. Meus pais ralaram muito em áreas não-artísticas para que eu pudesse existir.


Meus parentes também. Nenhum deles fez carreira sendo única e exclusivamente artistas ou musicistas. E sei que minha história não é única por aí. Não sou um "privilegiado". Taís Veloso: Realmente. É um privilégio tocar um instrumento. Na sua época não existia o NEOJIBA (Nucleos estaduais de Orquestras juvenis e infantis) . Na sua infância . Certo ?

George Christian: Certíssimo. Nasci em 1981. O NEOJIBA é algo bem posterior.

Taís Veloso: Você tem uma história interessante que eu acho que muitos musicos tem também. Começou a demonstrar uma inclinação musical muito cedo e foi estudar pra ser professor de inglês, Certo? Você cursou letras ( inglês) na UFBA. Você acha que essa experiência foi o que te levou pra música de vez ? Porque logo depois você foi cursar música também na mesma instituição de ensino.

George Christian: Eu já demonstrava também um interesse na literatura desde a adolescência, como também pela língua inglesa cantada pelos meus músicos favoritos. Eu via, como sigo vendo até hoje, a letra de canção como poesia e literatura naturalmente. Tanto que me investi no campo da poesia a partir dos 14 anos.


Eu era imbuído de uma vontade de querer ser cantor-compositor desde quando conheci Bob Dylan e desde a minha época em Letras pela UFBA (onde estudei de 2002 a 2007 e me formei na Licenciatura em Letras Vernáculas com Língua Estrangeira). Tenho uma série de livros não-publicados. Mas houve um assalto à mão amada que sofri por volta dos 26 anos em que, praticamente, tive o sumiço de um caderno de poesia. Eu estava me sentindo numa fase muito criativa poeticamente e de repente, me senti abruptamente subtraído.


Outro evento que desencadeou a vontade de fazer música instrumental foi a demissão de meu primeiro emprego, como revisor de textos pelo Colégio Integral no final de 2007. Em 2008, entrei num profundo questionamento existencial.


Fiz alguma terapia e pratiquei yoga e tudo isso me fez descobrir minha voz como compositor de música instrumental, apesar de ter canções escritas desde a época no curso de Letras. Minha entrada no curso de Composição em 2013 foi uma imensa vitória pessoal, depois de um Bacharelado em Inglês incompleto (que cursei só pra atualização de meu currículo). Hoje posso dizer que sou, convictamente, um compositor.

Taís Veloso: Claro que você é um compositor. Nunca tive a menor dúvida. Mas me fala. Quem é referência musical pra você atualmente além dos que você já citou? George Christian: Olhe, tem muito mais artistas além desses que citei. Ouvi muito Beatles, Rolling Stones, Pink Floyd, Led Zeppelin, Cream, Byrds, Black Sabbath, David Bowie, Mutantes, Novos Baianos e Secos & Molhados desde a adolescência.


A partir de 1997, comecei a ter uma perspectiva mais experimental em termos musicais: passei a ouvir mais Frank Zappa & The Mothers of Invention, Velvet Underground, Sonic Youth, Mercury Rev, My Bloody Valentine. Houve um marco para mim, no entanto, durante a época no curso de Letras, que foi um ciclo de palestras sobre Música Contemporânea dada pelo compositor italiano Aldo Brizzi, no Goethe Institut. A partir daí, meus ouvidos mudaram radicalmente! Eu passei a perceber que os verdadeiros vanguardistas eram compositores eruditos como Schönberg, Stockhausen, Scelsi, Nono, Cage, Nancarrow... e fiquei pirado com isto! Mas um evento que tenho como um marco para mim foi a descoberta do trabalho do violonista e compositor John Fahey em 2008.


Foi ele a minha inspiração primeira no meu trabalho instrumental ao violão. Depois disso, Fred Frith, Keiji Haino, Derek Bailey. A cena do Krautrock me fez começar a perceber outras territorialidades de vanguardismo musical.

Taís Veloso: Eu diria que o que você faz é música clássica contemporânea. Você concorda? qual é o estilo?

George Christian: Pode-se dizer que sim, até. Embora eu nem sempre tenha um compromisso firmado com ela no que diz respeito a um trabalho partiturado de maneira disciplinada. Sou um compositor que faz música independentemente dos parâmetros regulares e estabelecidos. Não a rigor. Há diversos outros gêneros com os quais já lidei. O folk-rock ou rock experimental, por exemplo, podem ser ouvidos na minha trilogia "Exílios". A livre-improvisação eletroacústica em "Secretos Universos". Eu prefiro deixar que o ouvinte formule seu pensamento enquanto me escuta.

Taís Veloso: Falando nisso. Qual a diferença de sinfonia pra uma música que você faz ? Qualquer músico pode criar sinfonia ou é só coisa de gênio. Exemplo: (Só Beethoven e caras do nível dele podem se aventurar a criar sinfonias).

George Christian: A sinfonia é uma forma mais ou menos estabelecida de composição, que é uma narrativa longa e que pode ser dividida em movimentos. Nem todo mundo conseguiria criar uma, pois ela normalmente demanda uma gama variada de instrumentos e orquestração. Eu tenho uma sinfonia, por sinal mas ela está incompleta.

Taís Veloso: Quando o sentimento é muito grande as palavras não são necessárias e aí é por isso que as músicas instrumentais mexem tanto com as pessoas. Concorda ? 0% 100%?

George Christian: Não de todo. Isso depende muito da profundidade de uma determinada obra. Há música instrumental masturbatória, como também há canções singelamente menores e que podem despertar muito mais sentimentos. A composição é uma coisa estranha, mas ela sempre depende da entrega do trabalho.

Não cheguei a mencionar, mas Johann Sebastian Bach foi o primeiro compositor que me fez chorar na vida; desde quando ouvi a "Chaconne" para violino, de uma de suas suítes, eu passei a perceber a gama profunda de sentimentos e de criação de trabalho musical que há numa música instrumental. Nem sempre o tipo de amor (no sentido mais profundo filosoficamente falando) que é encontrado na "Chaconne" de Bach é encontrado por aí.

Instagram: @gc.soundartifacts

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