Durante o isolamento social entrevistei o artista visual Danilo Cardel, adepto a religião de matriz africana, o baiano de 23 anos, estuda belas artes na Universidade Federal da Bahia e nas horas vagas trabalha em seu ateliê na Barra. Danilo se identifica com o sertão baiano. Presentes em suas obras: o sertão, a Bahia e a religião, são marcas desse autor. Confira a entrevista na íntegra:
Taís Veloso: Danilo, você é um dos artistas visuais que eu mais admiro. Mas primeiro, explica quem é o artista visual e qual a diferença dele para o artista plástico? De uns tempos pra cá a impressão que eu tenho é que todo mundo agora se tornou ou quer ser artista visual. As artes plásticas saíram de moda ?
Danilo Cardel: Olha, Taís. Hoje em dia essa coisa de artista plástico e artista visual se tornou muito mais uma questão de currículo e semântica. Mas de fato, a formação de um artista plástico na prática é infinitamente maior do que a de um artista visual. O nome já diz: artes visuais para englobar as pinturas e ilustrações e artes plásticas que englobam o todo. Quanto a parte do "sair de moda"... Bom, isso eu não diria com certeza.
Taís Veloso: Me conta um pouco sobre sua infância, a sua arte hoje carrega muito as suas raízes, certo? Quais suas referências na época? o que você gostava de ver? você já tinha contato com as artes? E quem te introduziu a esse mundo artístico?
Danilo Cardel: Quanto a minha infância, ela foi bem dividida entre o meio rural e a urbe soteropolitana, o que me deu um arcabouço teórico infinitamente grande (perdão o pleonasmo) do que se tivesse ficado preso em uma realidade de várias. Eu diria que a herança rural que vem tanto da parte de mãe (alto Sertão paulista, o caipira de fato) quanto o de pai (migrante com terras na cidade de Barra do rio grande na Bahia) me deram uma visão muito ampla de mundo... O sertanejo é limitado pela dureza da terra em que vive, mas em contrapartida o soteropolitano é limitado pela própria realidade social e uma pitada de soberba. Foi no sertão que eu aprendi a parte prática da coisa e peguei toda a paleta de cores que uso, mas é inegável que a capital baiana me deu o tom do equilíbrio. Taís Veloso: Eu tenho um amigo artista que diz que não estuda artes na universidade porque depois todo mundo acaba fazendo o mesmo trabalho. O que você diria pra ele e para as pessoas que pensam assim em geral?
Danilo Cardel: Olha, eu diria que isso é longe de ser culpa da belas artes da Universidade ou das escolas de belas artes em geral. A culpa da massificação do trabalho artístico é a busca obsoleta pelo útil na arte... A arte contemporânea é multifacetada e não deve cumprir propósito técnico algum. Infelizmente, para a maioria o processo de aprendizado se resume ao sistema"copiar rumo a exaustão". Então é comum que saiam trabalhos parecidos, mas nunca iguais. Taís Veloso: Quem são seus artistas contemporâneos favoritos? e os antigos?
Danilo Cardel: Meus artistas contemporâneos favoritos são; Vick Muniz, Isabela seifarth, Zé de rocha e Hector Valdez. Quanto aos anteriores, diria que amo van Gogh, Matisse, Rodin e Egon scheichelle.
Taís Veloso: Você escuta música enquanto está trabalhando? o que você costuma ouvir?
Danilo Cardel: Olha Taís, a questão da música é complicada! Pois sou eclético ao extremo e ouço músicas que normalmente tem haver com o tema que estou pintando ou ilustrando. Ou seja, desde o toque armorial a música difonica da Mongólia
Taís Veloso: Me fala um pouco do seu processo criativo, a obra aparece pronta na sua cabeça ou você vai criando aos poucos?
Danilo Cardel: Normalmente ela aparece pronta. Como um flash, uma junção de diversas coisas que vi, ouvi e senti ao longo da minha vida. O que não facilita em nada a sua passagem para o papel... Ao contrário, só dificulta. Taís Veloso: Você gosta de Graciliano Ramos ? Esse livro marcou sua vida ou é só uma impressão minha? É porque eu sempre penso em Vidas Secas quando vejo seu trabalho.
Danilo Cardel: Engraçado você perguntar isso, mas embora eu tenha sim lido vidas secas como todo bom estudante de ensino médio, não foi no livro que me inspirei pro cerne do meu trabalho... Fui direto na fonte, nos sertões profundos da Bahia, onde todos os dias são dias de vidas secas. Aquele cenário me balançou e despertou em mim um chamado ancestral... Como se dissessem: "Hora de acordar". Taís Veloso: Falando em literatura, a literatura te inspira?
Danilo Cardel: Na questão escrita eu sou mais um roteirista e cronista do que um ilustrador. Sim, faço os dois trabalhos, mas tenho muito mais prazer em narrar uma história do que em dar-lhe forma com o pincel. Fica mais fluído, de mais fácil entendimento... Ao mesmo tempo que infelizmente Cria um pedestal que a arte ilustrativa destrói. Taís Veloso: O que o Sertão da Bahia significa pra você?
Danilo Cardel: Na questão escrita eu sou mais um roteirista e cronista do que um ilustrador. Sim, faço os dois trabalhos, mas tenho muito mais prazer em narrar uma história do que em dar-lhe forma com o pincel. Fica mais fluído, de mais fácil entendimento... Ao mesmo tempo que infelizmente Cria um pedestal que a arte ilustrativa destrói. Taís Veloso: Fala um pouco da performance que você faz, qual a reação das pessoas e tem algum objetivo nela?
Danilo Cardel: Minha performance consiste em basicamente levar um pouquinho do sertão para a capital baiana. Como somos totalmente ilhados ente duas grandes porções de água (a baia de todos os santos e o Oceano atlântico) não temos historicamente uma ligação com o Sertão. Aí usar o gibão de couro e o chapéu nessa cidade tão deslocada da realidade sertaneja eu evoco o olhar dividido, duvidoso e curioso do povo na rua. Taís Veloso: E o que é arte pra você?
Danilo Cardel: Arte é o que mantém a mente sã e o corpo ligado. Arte é o que dá razão ao louco e cor ao cinza. Arte é a vida e a vida é arte.
Instagram: @cardeldanilo
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